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Para tudo! Vamos começar de novo. Aqui seria um espaço para troca de livros, mas acabou tornando-se um local de desabafos. Meus desabafos... Porque minha amiga Luciana abandonou o barco por causa de outros projetos e nunca mais postou nada. Então ela me pediu que reformulasse o blog e eu, Anoushe, sigo daqui com vocês que gostam de acompanhar um pouco do que fervilha em minha cabeça. A finalidade continua sendo trocar ideias, portanto, preciso mais da ajuda de vocês. Quem quiser dar sugestões para futuros textos, mande um e-mail. Podem também enviar textos sobre um livro que leram, uma música que os emocionou, peça de teatro, filme, enfim... Haverá um espaço reservado para suas impressões, tornando esse blog mais participativo e realizando uma efetiva troca de ideias. Conto com vocês, como sempre, para dar seguimento a isso que considero vital: trocar ideias, apreciar a arte, observar e conhecer pessoas e escrever... escrever... escrever...! "Eu escrevo sem esperança de que o que eu escrevo altere qualquer coisa. Não altera em nada... Porque no fundo a gente não está querendo alterar as coisas. A gente está querendo desabrochar de um modo ou de outro..." - Clarice Lispector

terça-feira, 24 de novembro de 2015

Janelas Solitárias



Como de costume, eu estava fazendo minha caminhada matinal pelas alamedas de Brasília apreciando especialmente os ipês amarelos que começavam a florir, contrastando com o céu azul quando passei em frente à janela de um dos blocos perto de minha casa e a figura solitária de um senhor, de seus 70 anos, me chamou a atenção.
Esse trajeto eu percorria há dez anos e, a exceção de alguns dias, ele sempre estava lá, cumprindo o mesmo ritual. Sempre sozinho. Parei para observá-lo.
Comecei a imaginar o porquê e há quanto tempo seriam mais de dez anos? esse senhor estaria ali, sozinho, parado, observando com certa nostalgia, o que se passava fora de sua casa. Fantasiei que, talvez, no início, seu horizonte fosse menos encoberto, as árvores menores atrapalhariam menos a sua visão. Depois, com o passar dos anos, a paisagem teria mudado, as árvores crescidas já haveriam encoberto grande parte dos prédios da frente, o parquinho, a quadra de futebol, talvez restasse apenas a vista do imenso céu azul, ou nublado, nos dias de chuva.
Imaginei se ele se sentiria sozinho e ao me lembrar de como cada vez mais as pessoas se tornaram individualistas, egoístas, projetei que, em um futuro não muito distante, talvez exista um mundo repleto de pessoas solitárias, cada qual em seu apartamento, avistando a paisagem ideal, perfeitamente construída em seus imaginários.
Tal qual a paisagem “ideal”, muita gente quer uma vida “ideal”: sem exigências, sem sacrifícios, sem generosidade, sem espaço para abrir mão do sossego, do dinheiro, do corpo perfeito, das viagens a qualquer tempo, de viver sem precisar dar satisfação.
Uma vida sem dívidas, sem ruídos, sem discussões, sem bagunça, sem opiniões externas que diariamente te fazem refletir sobre suas convicções cristalizadas.
Uma vida sem sorvete derramado no chão, sem copos quebrados na cozinha, sem rabiscos na parede, sem cabelos no ralo, sem roupas espalhadas, sem noites veladas.
Porém, sem beijos de borboleta, sem pernas que se entrelaçam durante a noite buscando a pele já tão conhecida que se confunde com a sua. Sem ter ao seu lado alguém cuja intimidade é tão grande que advinha seus pensamentos, seu olhar. Sem uma mão que te toca e conforta, fazendo-se desnecessárias quaisquer palavras...
Uma vida sem ter quem saiba que você odeia jiló, mas adora melancia e tempera tudo com noz moscada. Sem ter quem saiba que você dorme demais, mas que se for acordada com um beijo, vai sempre levantar de bom humor.
Continuei a observar o incógnito senhor e comecei a imaginar se ele teria sido um jovem que renunciou à convivência diária, às discussões, nem tão diárias, ao choro de crianças, às cobranças femininas e masculinas que te fazem aprender a lidar com fraquezas, ciúmes, inseguranças, parentes, TPM, cervejadas, gritos, dívidas por causa de viagens ou do cursinho do caçula. E como recompensa teria conquistado uma vida confortável, organizada, com tempo de sobra para apreciar e idealizar um horizonte perfeito. Porém, solitária, talvez vazia...
Quem sabe ele teria escolhido a tranquilidade de não ter conflitos por só precisar conviver com suas questões; de não precisar dar satisfação a ninguém; de ter uma casa limpa, silenciosa e organizada.

No meu devaneio, no futuro haveria um mundo repleto de janelas com lindos horizontes a serem contemplados sem pares. Contemplados por pessoas que optaram pelo isolamento para não se machucar, para não cair e precisar se reerguer, por medo de talvez perder, talvez precisar modificar suas convicções, talvez precisar ceder, sofrer... Janelas repletas de vidas cômodas e vazias.